A 30ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, ao julgar o Agravo de Instrumento nº 2176338-18.2025.8.26.0000, proferiu decisão de grande relevância para o contencioso empresarial, ao admitir a inclusão de empresa controladora de sociedade de propósito específico (SPE) no polo passivo de cumprimento de sentença, sem necessidade de instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica (IDPJ), previsto no artigo 50 do Código Civil e nos artigos 133 e seguintes do CPC.
A controvérsia teve origem na tentativa frustrada de penhora de bens de uma SPE, criada para a execução de empreendimento imobiliário já concluído. Frente à inatividade financeira da SPE e à ausência de bens penhoráveis, a credora requereu a responsabilização direta da empresa controladora, sustentando a existência de grupo econômico de fato e uso indevido da estrutura societária como instrumento de blindagem patrimonial.
A decisão de primeira instância havia determinado a necessidade de instauração de IDPJ. Contudo, o TJSP reformou tal entendimento, reconhecendo que não se tratava de responsabilização de terceiros por abuso da personalidade jurídica (hipótese do art. 50 do CC), mas sim de extensão da responsabilidade à controladora, fundada no artigo 265 da Lei nº 6.404/76 (Lei das S.A.), diante da comprovação da atuação em grupo econômico de fato.
A Relatora, Desembargadora Maria Lúcia Pizzotti, destacou que a SPE foi mantida artificialmente ativa mesmo após a entrega do empreendimento, sem movimentação financeira, configurando indício de utilização para blindagem patrimonial da controladora. Ressaltou-se que, diferentemente do que ocorre na desconsideração da personalidade, a hipótese tratava da responsabilidade direta e ordinária da empresa-mãe, cuja ingerência e controle sobre a controlada são evidentes.
Nesse contexto, a inclusão da empresa controladora no polo passivo foi autorizada sem a necessidade de IDPJ, especialmente diante da inércia da devedora e da comprovação de que o empreendimento beneficiou a controladora, que detinha o domínio efetivo da operação.
A decisão também foi fundamentada em precedentes do próprio TJSP, que têm reiteradamente reconhecido a responsabilidade direta de controladoras em casos de esvaziamento patrimonial de SPEs após a conclusão de projetos imobiliários, caracterizando fraude à execução e desvio de finalidade.
Impactos e reflexões
Este acórdão sinaliza relevante avanço na jurisprudência paulista ao reforçar o dever de diligência e responsabilidade das empresas controladoras sobre suas controladas, especialmente em contextos de grupos econômicos que operam por meio de sociedades de propósito específico. A tese adotada confere efetividade à tutela executiva e evita que estruturas societárias sejam manipuladas para frustração de credores.
É recomendável que empresas que operem com SPEs revisem seus modelos de governança e encerramento de atividades após a conclusão dos empreendimentos, evitando a manutenção artificial dessas estruturas, sob pena de responsabilização direta.